sábado, 25 de junho de 2011

Estante

As mãos alvas e ossudas envolviam o gargalo da garrafa como se pertencessem ao seu corpo.
Sua boca salivava e seus lábios de sangue lembravam do gosto que tinha o céu. O céu estava dentro de uma garrafa, ali, plantada firme como um salgueiro em frente ao corpo esguio da menina.
E ela almejava um único gole... Ah, se pudesse apenas sentir seu cheiro... Mas ela sabia que um gole nunca lhe bastava; mas ah... ela queria apenas uma gota... Mas uma gota não lhe bastava... Mas se ela pudesse tomar apenas um gole.
Mas ela resistia. Ah, ela guardaria a garrafa na estante; ah, ela deixaria que juntasse poeira...
Mas quando seus lábios provavam um gole do céu sua pele alva ganhava todas as cores do mundo... Ah, seu corpo ganhava vida, sua alma voava.
Mas ah... quando o céu descobria que haviam bebido um pouco dele, o corpo do pecador queimava de dentro para fora.
Ah, ela sabia o quanto o fogo ardia... Mas ah... o céu lhe enchia de cores.
Ah, ela jogaria a garrafa no mar... Deixaria o céu a deriva...
Ah, ficaria guardada em uma garrafa, ao lado do céu, em uma estante empoeirada e esquecida.
Ah... se esqueceria em uma estante.

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